As múltiplas facetas e culturas brasileiras desencadeiam peculiaridades em todas as manifestações artísticas — e a música, claro, não ficaria fora disso. Em cada região, estado e cidade há histórias particulares que refletem diretamente na arte feita e criada no Brasil, o qual é, definitivamente, um país completamente plural. Não à toa, faz história e é referência internacional. Um dos exemplos de produção cultural nacional é o Movimento Manguebeat, que completa 30 anos de história em 2022.
Com uma brasilidade estonteante, o movimento, que surgiu na capital pernambucana a partir de 1991 (e foi um grande sucesso na década de 1990), mescla elementos da cultura regional com a cultura do pop, rock e hip-hop. Para além da musicalidade, essa manifestação artística também trouxe uma identidade visual fortíssima para exprimir essa combinação, utilizando-se de itens como o chapéu, típico da história de Pernambuco, assim como outros pop, criando uma unicidade inconfundível.

Origem e importância social do Manguebeat
O início da história do movimento ficou marcado pelo manifesto chamado “Caranguejos com Cérebro”, que aconteceu em julho de 1992 e buscava reivindicar a situação de Recife, uma das cidades com um dos índices mais baixos de desenvolvimento na época. Historicamente, em meados do século XVII, a capital pernambucana começou a crescer em completa desordem após a expulsão dos holandeses. Em consequência, os seus rios e mangues foram aterrados, desmantelando áreas enormes para o município e os seres vivos que ali viviam.
Tamanha desordem foi totalmente prejudicial para o futuro e desenvolvimento de Recife, com os danos evidentes mesmo cerca de cem anos após a fundação oficial da cidade. O caso recifense foi o motor para que músicos se engajassem através da arte para refletir sobre a realidade da cidade, resultando em um movimento que se destacaria no cenário musical, o Manguebeat.

É curioso, também, compreender o conceito de contracultura — o chamado movimento tropicalista da época de 1960 —, que após trinta longos anos, chega para influenciar e expor a realidade do Nordeste brasileiro a partir do movimento Manguebeat. Em 1991, este começou a tomar forma, com suas manifestações ganhando força gradualmente e sendo abraçadas pelos artistas. De fato, o nome vem da junção de “manguezal” com “beat” – “batida” em inglês, segundo a tradução livre.
O texto do manifesto, intitulado “Caranguejos com cérebro”, foi compartilhado em 1993 como encarte do primeiro disco do Chico e Nação Zumbi, “Da lama ao caos” (1994), igualmente considerado o marco para o movimento. Ao longo de suas três partes, a manifestação busca chegar ao restante do Brasil com seus ideais e objetivos das mensagens propostas dos mangueboys.
Além dos elementos característicos e da identidade única, o Manguebeat ocupou seu espaço pela importância social e urgente. Vale lembrar que o movimento foi bastante influenciado pelo livro “Homens Caranguejos”, de autoria do sociólogo Josué de Castro. A obra busca apresentar a vivência entre a interseção dos homens dos mangues com os caranguejos, analisando profundamente um complexo paradoxo da civilização brasileira: a miséria.
Os responsáveis por esse importante movimento pernambucano, Chico Science, Nação Zumbi e Mundo Livre S/A fizeram história ao unir arte e ideais sociais. Science, Fred Zero Quatro (vocalista do Mundo Livre S/A), o jornalista Renato Lins, entre outros nomes, foram os encarregados pelo manifesto.
Grandes representantes do Movimento Manguebeat, o Nação Zumbi é uma referência em composições e musicalidade, principalmente para trazer os holofotes ao movimento, fidelizando Chico Science no meio artístico cultural. Desde então, o movimento continua influenciado Pernambuco, mesmo após 30 anos desde que começou a tomar força em Recife.
Chico Science
Conhecido como Chico Science, Francisco de Assis França é o mais famoso e representativo artista do Movimento Manguebeat, sendo uma grande referência até os dias atuais. Sua carreira foi meteórica, visto que em menos de três anos, gravou dois discos e fez duas turnês mundiais, incluindo na Europa e Estados Unidos. Apesar da morte prematura aos 30 anos em 1997, deixou um grandioso legado, com suas músicas sendo influência para muitos grupos musicais e estudiosos da cultura brasileira.

Para saber mais: DOC “Manguebit”
Importante documentário sobre o movimento, “Manguebit” foi planejado e montado pelo diretor Jura Capela por sete anos. Muitos arquivos que compõem a produção audiovisual são inéditos. A sinopse pontua: “O filme experimenta a liberdade do pensar do mangue por meio de uma linguagem multifacetada, que reúne ideias e ideais, refletindo a ousadia que deu vazão ao grande símbolo do movimento: uma antena parabólica enfiada na lama dos estuários”.

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