Diferente da culinária italiana ou francesa, a gastronomia molecular é um conjunto de técnicas inseridas na cozinha convencional para “brincar” com os alimentos, utilizando-se de componentes químicos para causar alterações nas formas e texturas da comida. Sem alterar o sabor, esse moderno e interessante método busca provocar diferentes sensações no paladar.
A Chef Angélica Vitali, do Gastrô Brasil Gastronomia e autora do livro “Gastronomia, Ciência e Arte”, fala: “Ao contrário do que muitos pensam, a gastronomia molecular não é um tipo de cozinha, como temos a brasileira, italiana, japonesa, entre outras. É um conjunto de técnicas que podem ser aplicadas em qualquer área de alimentos e bebidas. Para que as técnicas possam ser aplicadas, você precisa saber as bases, tanto da gastronomia quanto da mixologia”.
Para a profissional, a parte “química” está presente em toda a gastronomia. Ela reflete: “Se pensarmos, cozinhar é pura química. A simples transformação de um ovo em seu estado natural ao ser colocado em uma frigideira aquecida e quase que, instantaneamente, pelo calor, ele se transformar em algo sólido com coloração diferente da original é química”.
Segundo Vitali, as técnicas e ingredientes são a única diferença da gastronomia molecular, visto que restaurantes de cozinha clássica (como francesa, italiana etc.) podem usar esse método e/ou diferentes alimentos para melhorarem “os processos e produto final”, entregando experiências gastronômicas excepcionais.
Qual é a origem da gastronomia molecular?
A gastronomia molecular passou a integrar a culinária a partir da última parte do século XX, quando um físico chamado Nicholas Kurti apresentou um programa de TV no Reino Unido intitulado The Physicist in the Kitchen (“O Físico na Cozinha”, em tradução livre), conforme lembra Vitali sobre a origem dessas técnicas.
Transmitido em 1969 pela BBC, o programa foi considerado um marco da gastronomia moderna exatamente por expor a relação entre ciência e culinária, chegando às casas das pessoas pela primeira vez. Ao lado de Kurti, o cientista francês, Hervé This, foi responsável por “estabelecer e promover o estudo da ciência culinária”.
“Antes disso, a pesquisa de ciência dos alimentos era focada em áreas como a segurança dos alimentos, microbiologia, preservação, química, engenharia e física. Muito foi descoberto pelos grandes fabricantes de alimentos que queriam melhorar a qualidade, o sabor e a durabilidade dos seus produtos, ou por biólogos e cientistas para cozinheiros amadores. Mas cozinhar em si nunca foi considerado um campo de grande interesse cientifico,” explica Vitali.
Esse cenário mudou completamente com as propostas de Kurtis e This. Em 1984, a primeira “bíblia” de ciência da comida, “On Food and Colling: The Sciencee and Lore Of The Kitchen” (“Sobre comida e coleta: a ciência e a tradição da cozinha”, em tradução livre), de Harold MacGee, foi publicada. Segundo a chef, é “um livro de grande importância para os chefs profissionais e amadores”.
Para Fábio Mattos, chef executivo do restaurante Poco Tapas, a experiência com a técnica molecular é única e memorável. “Você vai comer uma caipirinha, você vai comer shoyu e azeite de oliva transformado em pó. Você vai comer muita coisa que é normalmente muito difícil de fazer em casa e a gente não reconhece. Mas vai ter o gosto daquilo que a gente conhece,” diz.
Onde a gastronomia molecular está inserida?
Após as ideias de Kurtis e This serem abraçadas por chefs de diversos países do mundo, essas técnicas passaram a ser inseridas em diversos pratos, restaurantes, e até mesmo em receitas diárias. “A gastronomia molecular pode ser utilizada em um drinque, entrada, prato principal e sobremesas, seja para ter a parte lúdica com transformações surpresas nas texturas, ou somente para aplicação de aditivos, ou técnicas que ajudem para a maior agilidade na operação, para o aproveitamento total dos alimentos, entre outros.” explica Vitali.
“Todo mundo pode fazer gastronomia molecular. Todo mundo que quer aprender a cozinhar, deveria saber gastronomia molecular porque é a gastronomia mais moderna e, muitas vezes, é até melhor utilizá-la porque ela vai dar um desempenho melhor. Funciona fazer em casa também. A gastronomia molecular não é tão complicada quanto as pessoas gostariam que ela fosse,” ressalta Fábio Mattos.
Ainda, o chef executivo do Poco Tapas acrescenta: “Tem muitos chefs de cozinha que tentam esconder receitas, esconder técnicas, e não é o meu caso. A gastronomia molecular tem que se fundir no nosso dia a dia, porque é muito divertido e muito legal de trabalhar com ela”.
Por que o termo “gastronomia molecular”?
Esse campo de estudo gastronômico foi, inicialmente, intitulado “ciência e gastronomia” por Kurti, de acordo com Vitali. Mais tarde, porém, quando o físico se uniu a Hervé This para o primeiro workshop que buscava reunir chefs e cientistas, os dois foram convidados a repensar o termo para apresentar uma proposta mais científica. Assim, optaram por “gastronomia molecular física”, posteriormente chegando ao conceito mais conhecido atualmente, “gastronomia molecular.”
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