Rita Lee sempre se mostrou como uma artista em permanente transformação. Apresentada ao mundo, ainda na década de 1960, como terceiro elemento dos irreverentes Os Mutantes, a cantora e compositora foi também frontwoman de uma banda da pesada, autora de hits inesquecíveis e, por fim, ícone inquestionável da história da música brasileira.
Aclamada como a “Rainha do Rock Nacional” – título considerado cafona por ela, mas que sempre foi a mais pura verdade –, Rita deixou os seus milhões de súditos sem majestade após dois anos de luta contra o câncer de pulmão. Na noite de 8 de maio, aos 75 anos, Rita estava em casa, em São Paulo, “cercada de todo o amor de sua família, como sempre desejou”, segundo a nota enviada à imprensa sobre o momento de seu falecimento.
Sucessos e influência na música brasileira
Em seis décadas, Rita Lee passou de jovem menina vocalista de Os Mutantes para a dona de uma carreira sólida, baseada em talento, carisma e atitude, e trilhada com sucessos como “Ovelha Negra”, “Lança Perfume”, “Mania de Você” e “Baila Comigo”. Sua influência também ultrapassou gerações. Paula Toller (Kid Abelha), Fernanda Takai (Pato Fu), Cássia Eller, Zélia Duncan e Pitty são legítimas devotas de “Santa Rita de Sampa”.
55 milhões de discos vendidos na carreira solo de Rita Lee
E se os números não mentem, os de Rita indicam o sucesso: são 55 milhões de discos vendidos na carreira-solo, segundo dados do mercado fonográfico nacional, o que a coloca como a quarta artista mais bem-sucedida em termos comerciais no Brasil. Também não faltaram prêmios, biografias, especiais de TV e tributos, além do reconhecimento como a 15ª maior artista da música brasileira de todos os tempos, de acordo com votação da revista Rolling Stone Brasil, em 2008.
Rita Lee foi passear
Nascida na Vila Mariana, na capital paulista, no último dia do ano de 1947, Rita Lee Jones era a filha mais nova do casal Charles Fenley Jones e Romilda Padula. Desde a adolescência, ela já indicava que, apesar de sonhar em ser atriz de cinema, a música seria o seu caminho para o resto da vida.
Se antes as aulas de piano clássico e os discos de Cauby Peixoto, Carmen Miranda e a bossa nova de João Gilberto da coleção dos pais faziam a cabeça da pequena Rita, ao dar ouvidos a Elvis Presley, Neil Sedaka e Beatles, ela encontrou sua veia rock n’ roll. A trajetória musical iniciou-se com as Teenage Singers, uma bandinha formada na escola, que depois se uniu aos rapazes dos Wooden Faces, resultando no grupo chamado “Os Seis”.
O surgimento dos Mutantes
Com a saída de metade da banda, “sobraram”, além de Rita, dois jovens e talentosos irmãos, o multi-instrumentista e compositor Arnaldo Baptista – futuro marido de Rita – e o guitarrista Sérgio Dias. Assim, fundaram-se Os Mutantes, que, para muitos, é a banda mais importante e influente que o rock brasileiro já entregou ao mundo.
Com poucos anos de estrada, Rita, Arnaldo e Sérgio acompanharam os tropicalistas Caetano Veloso e Gilberto Gil, produziram discos fundamentais orientados no mais inventivo rock psicodélico e compuseram obras-primas como “Ando Meio Desligado” e “2001”. Posteriormente expandido para um quinteto e de olho nas bandas do rock progressivo inglês, Os Mutantes já não queriam Rita, e ela precisou trilhar outro caminho.
Rita Lee: me libertei daquela vida vulgar
Sem banda (e sem casamento), Rita Lee, em um belo dia, resolveu mudar, como diz ela em “Agora Só Falta Você”. Com um som baseado nas guitarras dos Rolling Stones e um visual glam no estilo David Bowie, Rita se juntou a músicos como Luiz Carlini (guitarra) e Lee Marcucci (baixo) e formou o Tutti Frutti. Esse período também resultou em mais uma penca de clássicos roqueiros, entre eles “Esse Tal de Roque Enrow”, “Jardins da Babilônia” e “Ando Jururu”, distribuídos em quatro discos, com destaque para o fenomenal “Fruto Proibido”, de 1975.
O eterno parceiro Roberto de Carvalho
Com a separação do Tutti Frutti, Rita resolveu se unir ao tecladista Roberto de Carvalho, por quem estava perdidamente apaixonada. Ao lado de seu futuro marido e pai de seus filhos Beto, João e Antonio, ela demonstrou talento ímpar para compor canções que combinavam letras inteligentes, apelo pop e vocação radiofônica.
Rita e Roberto chegaram, então, ao posto de dupla dinâmica do mercado musical brasileiro. Entre 1979 e 1990, foram nove álbuns que venderam como poucos nesse período no Brasil e consagraram a artista definitivamente. Sucessos como “Chega Mais”, “Doce Vampiro”, “Caso Sério” e “Banho de Espuma” tocavam sem parar em rádios e telenovelas.
Sucessos no fim de carreira da dama do rock nacional
Até seu último álbum “Reza”, de 2012, a carreira da grande dama do rock nacional se manteve em alta. Nas últimas décadas, ela conseguiu atrair novos fãs com discos ao vivo, como “Rita Lee em Bossa n’ Roll”, de 1991, e “Acústico MTV”, de 1998, o tributo aos Beatles em “Aqui, Ali, em Qualquer Lugar”, de 2001, e sucessos como “Amor e Sexo”, “Erva Venenosa” e “Pagu”. Sempre como uma autêntica rainha do rock, feita de liberdade, ironia e senso de humor.
Curiosidades e mais histórias de Rita Lee
- O nome Lee, recebido por Rita e suas irmãs Mary e Virginia, foi uma homenagem do pai ao famoso general norte-americano Robert E. Lee, conhecido por comandar o exército da Virgínia do Norte durante a Guerra Civil Americana;
- A primeira participação de Rita em uma gravação de estúdio foi como backing vocal em uma canção de Prini Lopez, expoente do rock latino;
- Vegana, a artista sempre se posicionou a favor da causa animal por meio de declarações e até mesmo com um livro infantil, chamado de “Amiga Ursa”;
- Em 1995, Rita realizou um sonho: foi convidada pelos próprios Rolling Stones a ser a atração de abertura dos shows que a banda inglesa fez no Brasil;
- Ícone no rock, Rita Lee rasgou o verbo sobre o machismo nas bandas: “Sempre gostei de rock pesado. E era difícil naquela época. Eu era convidada a tocar só pandeiro. Machismo puro”.