Jogo com inúmeros benefícios mentais, o xadrez pode ser utilizado não apenas para a diversão, mas também para o desenvolvimento de uma série de habilidades
Com a mente sempre em foco e sendo a ‘peça principal das jogadas’, o xadrez é um esporte que desafia constantemente os seus participantes, e cada movimento precisa ser estrategicamente pensado. Esse jogo de tabuleiro, que envolve duas pessoas, é repleto de curiosidades e benefícios, sendo importantíssimo para o desenvolvimento de diversas habilidades.
No xadrez, cada jogador começa com 16 peças, incluindo um rei, uma dama, dois bispos, dois cavalos, duas torres e oito peões. Nele, os jogadores
tentam capturar as peças adversárias – no caso do rei, o objetivo é dar xeque-mate nele -, enquanto protegem as suas próprias peças.
A estratégia, nessa prática, envolve pensar à frente, avaliar as possíveis jogadas do adversário e tomar decisões cuidadosas sobre como posicionar as peças e, assim, alcançar uma posição vantajosa no tabuleiro. E é certo que, ao longo desse processo, é preciso do conhecimento de táticas e estratégias, que são desenvolvidas com a prática.
“Em uma partida de xadrez, precisamos calcular as possíveis jogadas – lances próprios e do oponente – e compará-las para poder tomar uma decisão. Em seguida, as diversas variantes visualizadas são ‘jogadas fora’. […] Precisamos elaborar planos, e as nossas decisões obedecem a uma estratégia geral e a um momento de cálculo: a tática”, explica Léo Pasqualini, professor de xadrez.
Em uma partida de xadrez, precisamos calcular as possíveis jogadas – lances próprios e do oponente – e compará-las para poder tomar uma decisão.”
Léo Pasqualini, professor de xadrez
O profissional acrescenta: “A cada lance da partida de xadrez, temos que resolver problemas e tomar decisões. É um exercício que ocorre durante toda a partida, por isso exige foco (atenção concentrada) por um longo tempo. O exercício constante de resolver problemas e tomar decisões consome muita energia, e o jogador aprende a dosá-la, mas sabe que é uma luta constante. Cada passo é uma decisão, e cada jogada é um labirinto a se escapar e um enigma a se resolver”.
Para o psicólogo Luiz Ricardo Miguel, este é, inclusive, um dos principais destaques do esporte: “A prática regular do xadrez nos estimula a sermos mais críticos no momento de tomar uma decisão, incita-nos a perceber variáveis que ficariam ocultas num olhar mais desatento. Devido à grande quantidade de jogadas possíveis, fornece um vasto repertório de possibilidades no qual o indivíduo aprende novas formas de resolução de problemas”.
Benefícios para a saúde mental
São muitos os benefícios mentais e cognitivos oferecidos por essa prática, como memória aprimorada, aumento da capacidade de concentração e melhora da capacidade de resolução de problemas. “O xadrez é um exercício mental. Ele estimula a criação de novas sinapses em áreas do cérebro relacionadas à memória, ao raciocínio lógico, à visão espacial, à imaginação e à criatividade. Mas é preciso praticar frequentemente para manter o cérebro em forma”, afirma o psicólogo.
Além disso, o esporte é uma atividade divertida e socialmente enriquecedora, que pode ser praticada por pessoas de todas as idades e origens. “O xadrez é uma língua universal. Em qualquer país do mundo, você vai encontrar parceiros dispostos a uma partida”, fala Pasqualini.
O xadrez é, portanto, frequentemente utilizado como uma atividade terapêutica para ajudar as pessoas a lidarem com uma variedade de problemas emocionais e psicológicos. Isso porque, além de desenvolver essas tantas habilidades, ele também pode ajudar a reduzir o estresse e a ansiedade, proporcionando uma forma saudável de entretenimento e concentração.
“Os benefícios psicológicos são os mesmos independentemente da idade. Alguns deles podem ser mais visíveis dependendo das particularidades da vida de cada um, mas não significam que os outros ganhos deixem de ocorrer. Por exemplo, para estudantes (que podem ser de qualquer idade), é uma ferramenta extra para ajudar na aprendizagem. Para um trabalhador que tem um dia bastante agitado, pode ser uma opção de lazer e de relaxamento. Muitos idosos vivem sozinhos, então o xadrez é ótimo para a socialização”, exemplifica o psicólogo Luiz Ricardo Miguel.
A prática regular do xadrez nos estimula a sermos mais críticos no momento de tomar uma decisão, incita-nos a perceber variáveis que ficariam ocultas num olhar mais desatento.”
Luiz Ricardo Miguel, psicólogo
No que diz respeito à saúde mental, o esporte também pode ajudar a melhorar a autoestima e a autoconfiança, especialmente quando os jogadores começam a ver melhorias em seu jogo. “O aluno deve entender que a derrota de um está contida na vitória de outro, e a partida não existe sem dois jogadores. Apresentar diagramas (posições) de resolução individual, por exemplo, de xeque-mates, e ver os seus alunos abrirem um sorriso ao descobrirem as soluções, com certeza, eleva a autoestima de qualquer um”, afirma Léo Pasqualini.
O xadrez e o Transtorno do Espectro Autista (TEA)
O xadrez tem sido utilizado como uma ferramenta terapêutica eficaz para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) por muitos motivos, seja pela concentração, pelo planejamento estratégico, pela tomada de decisões ou pela sociabilidade.
Segundo explica o psicólogo Luiz Ricardo Miguel, os ambientes das partidas de xadrez são bastante apropriados para pessoas com TEA. Isso porque elas, normalmente, “sentem-se mais confortáveis em ambientes com um número reduzido de pessoas e que não tenham muitos estímulos que possam desviar a sua atenção”.
“Por ser jogado por apenas duas pessoas e em ambientes mais calmos, o xadrez oferece um ambiente bastante apropriado. O autista pode inicialmente jogar xadrez com o seu terapeuta, professor ou familiar e, progressivamente, praticar o jogo com outras pessoas de modo a estimular a sua interação com o outro”, completa o profissional.
Léo Pasqualini acredita que essa conexão com as pessoas com TEA partem dos professores: “As intervenções realizadas durante a partida ajudam a estimular a interação social. Cabe ao professor-terapeuta intervir de forma lúdica, abrir espaço para o diálogo e para a confiança para que se cultivem laços sociais e vínculos entre professor e aluno”.
“Um dos meus alunos do transtorno do espectro autista (TEA) simbolizava as peças de xadrez, especialmente o rei e a dama, com nomes de personagens ou atores e atrizes: Rei Arthur, Henrique VIII, Ingrid Bergman, Rita Hayworth. Ele apreciava muito os filmes antigos, e assim foi uma das portas de diálogo que se abriram em todas as aulas. Ou seja, enquanto jogávamos xadrez, falávamos também sobre filmes antigos ou história universal”, conta o professor.
O profissional, ainda, conclui: “Enquanto os vínculos iam se formando, eu propunha exercícios de xeque-mate em um lance e ia orientando ele para que ele chegasse à solução por conta própria, o que aumentava a autoestima dele e fazia com que ele se sentisse cada vez mais à vontade durante as sessões de xadrez”.