No dia 8 de agosto de 2021, a central da Seleção Brasileira de vôlei, Carol Gattaz conquistou a medalha de prata dos Jogos Olímpicos de Tóquio. Com 40 anos na época, ela se tornou a atleta feminina brasileira mais velha a se tornar medalhista, considerando todas as modalidades. Mas o caminho para a conquista foi longo.
Presença na seleção desde 2003 e multicampeã pelo Minas e pelo Brasil, Carol Gattaz sofreu com um “corte” na convocação nas vésperas dos Jogos em Pequim em 2008. Ela também não fez parte do elenco nas Olimpíadas de Londres em 2012. No mundo dos esportes, a idade é um fator determinante para as competições de alto nível, mas a central conseguiu dar volta por cima e disputar os Jogos mesmo com uma idade mais avançada.
Apesar do feito, Carol não quer parar por aí e sequer pensa na aposentadoria. Em 2023, ela sofreu uma grave lesão no ligamento cruzado anterior do joelho e ficou nove meses afastada das quadras. Pela televisão, ela viu a seleção garantir uma vaga nos Jogos Olímpicos de Paris em 2024 depois de uma vitória suada contra o Japão.
Preparada para voltar a jogar, Carol passa a correr contra o tempo para retomar sua vaga na seleção e ser convocada para mais uma Olimpíadas. A atleta conversou com a revista de bordo da Voepass sobre a recuperação da lesão, a conquista da medalha e os planos para o futuro.
Você sofreu uma lesão grave no joelho no início de 2023. Como foi passar por esse processo de recuperação?
Carol Gattaz: Sofri uma lesão de LCA [Ligamento Cruzado Anterior]. Para mim realmente no início foi muito difícil, até porque passar por uma lesão dessa gravidade na minha idade, em que estou perto de me aposentar, é complicado. São 9 meses de recuperação, ou seja, um processo bem longo. Mas foram meses de muito autoconhecimento e paciência. Eu até fui mal compreendida, mas na verdade foi uma das melhores coisas que aconteceram, pois eu aprendi muitas coisas com essa lesão. Muitas coisas boas vieram. Claro que ninguém quer se machucar, mas quando a gente se vê com esse problema, nós tentamos tirar coisas boas dessa situação e foi o que aconteceu.
Você e o Minas acertaram a renovação para sua 10ª temporada no Minas. Por que você acha que essa união deu tão certo?
Carol: Foi um casamento que deu certo, com certeza, acho que pelo profissionalismo que o Minas tem aqui e pelo amor e acolhimento que me deram como família. Hoje eu posso dizer que eu tenho a cara do Minas e o Minas tem a minha cara. É um clube sério, clube família, preza muito pelo ser humano, e é uma coisa que eu gosto demais.
Em que momento da sua vida você decidiu ser jogadora de vôlei? Qual foi sua motivação?
Carol: Quando eu era mais nova em Rio Preto, eu decidi que seria jogadora de vôlei, porque eu amava o esporte. Antes, eu praticava vários esportes, mas a partir do momento que comecei a jogar vôlei e em Rio Preto tinha uma equipe que disputava jogos mais sérios, eu escolhi realmente o vôlei. Teve também a seleção de 94, que foi vice-campeã mundial no Ibirapuera, que eu lembro que vi aquele time jogar e me apaixonei.
A Superliga Feminina completou 30 anos no fim de 2023. Que mudanças e evolução você sentiu na competição nesse período?
Carol: Acho que a Superliga com certeza vem evoluindo ano a ano. Faltam ainda muitas coisas, que infelizmente ainda param em algumas limitações que a nossa confederação tem, mas vemos uma evolução importante. Acho que a principal evolução foi o amor que o brasileiro tomou pelo vôlei. Hoje é o segundo esporte em audiência de jogos, os ginásios sempre lotados e isso é muito importante. Essa mudança em comparação com o início da minha carreira é muito grande, o número de pessoas apaixonadas pelo vôlei cresce ano a ano.
Em 2023, completou 20 anos da sua primeira convocação para a Seleção Brasileira. Você se lembra qual foi a sua sensação?
Carol: Eu lembro da minha primeira convocação. Na época, o Zé Roberto [treinador] também veio para a Seleção Brasileira pela primeira vez. Foi uma surpresa muito grande, uma emoção muito grande. Eu estava muito feliz na época, porque eu sabia que ali era o início de uma história. Claro que eu não sabia qual seria a minha história, mas sabia que estava no caminho certo. Ser convocada para a Seleção Brasileira, principalmente naquela época, que eu era uma das mais novas do grupo, com certeza indicava que estava na direção certa. Mesmo depois de ter passado por tantas convocações, eu ainda sinto um frio na barriga e a emoção de defender o país. Para mim, a Seleção Brasileira hoje é amor, representar milhões de brasileiros não tem nada mais gratificante do que isso.
Ainda sobre a seleção, como foi pessoalmente para você a conquista da medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio?
Carol: Foi a realização do meu maior sonho de vida. Antes de ser convocada para ir para Tóquio, eu tinha isso de meta na minha carreira. É claro que o sonho estava ficando cada vez mais distante por conta da minha idade. O meu primeiro objetivo, lógico, era ficar entre as 12 convocadas, depois pisar na Vila Olímpica e mais ainda disputar uma final olímpica. Ganhar uma medalha foi muito mais do que eu imaginava, mas foi a realização do meu maior sonho sem dúvida nenhuma.
Como foi acompanhar as disputas do Pré-Olímpico deste ano de longe? Como você avalia o desempenho da Seleção na competição?
Carol: Acompanhar o Pré-Olímpico de longe foi muito ruim. Meu objetivo neste ano era disputar tudo com a seleção. Eu já tinha em mente que, claro, com o Zé Roberto me convocando, eu iria disputar tudo com a seleção e sem dúvidas foi muito ruim ficar longe. Foi difícil para mim, mas acho que a seleção foi bem, conseguiu a vaga que era o mais importante e ainda vai crescer muito. Neste ano, tivemos muitas baixas de meninas que estavam machucadas. A gente acredita que teremos força total para encarar Paris 2024.
Como você encara hoje a disputa por uma vaga no elenco para os Jogos de Paris em 2024?
Carol: Com certeza a disputa pela vaga vai ser muito mais difícil. Eu sei que estou voltando, vou precisar de alguns meses para retornar a minha forma normal. Não é fácil porque venho de uma lesão muito longa e preciso estar jogando, ter ritmo de jogo no meu time. Devo ter algumas oportunidades, mas as duas jogadoras que entraram no meu lugar estão muito bem, então sei que vai ser um desafio muito grande, mas espero que eu possa ter uma chance de pelo menos brigar até o último momento por essa vaga. Acho que posso contribuir um pouquinho com a seleção, com meu estilo de jogo e a minha experiência, mas vai ser uma briga difícil, muito mais do que antes.
Você já disse diversas vezes que não tem planos para se aposentar do vôlei. Como você se sente hoje, fisicamente e emocionalmente?
Carol: Eu falo que não tenho planos de me aposentar no vôlei, porque não quero estipular uma data. Eu amo o que eu faço, jogo por prazer, não tenho problemas com a rotina de atleta que é muito puxada. Eu, na verdade, amo essa rotina, então eu vou jogar até quando conseguir. Eu sinto que hoje, fisicamente, eu estou diferente. Depois dos 40, as coisas ficam mais difíceis, temos que nos superar a cada dia, mas eu ainda me sinto muito bem para jogar. E emocionalmente, que nem eu falei, eu amo jogar. Então eu vou dar o meu máximo para estar ainda em alto nível e quando eu ver que eu não estou mais dando frutos para o meu time, eu vou parar.
Na sua opinião, qual será o legado da sua carreira para gerações futuras?
Carol: Espero que meu nome um dia seja lembrado por ser aquela menina que não desistiu, aquela jogadora de vôlei que sempre correu atrás do seus sonhos, que teve muita disciplina, muita constância, superou o obstáculos, que foram marcos importantes na minha carreira, mas mais do que nunca, jamais desistiu dos seus sonhos. Eu sempre quis disputar as Olimpíadas e nunca deixei de acreditar que eu pudesse, por mais que as pessoas e o meu eu mais racional achassem que não ia conseguir. Eu lutei bastante, trabalhei muito, tive disciplina ao longo dos anos para que eu pudesse conseguir essa vaga. O mais importante é isso, que as novas gerações lembrem da Carol que não desistiu e brigou até o final para conquistar os seus objetivos.